Domingo, 28 de Abril de 2024

A cidade e as leis




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No último artigo relembrei que Civilização, Cidade e Cidadania nasceram juntas, xipófagas inseparáveis, uma não vive sem a outra e sem elas retroagimos à Barbárie.

Citei o caseiro Francenildo Santos do caso Palocci de 2006, o técnico Hígor Guerra do VLT em 2011 e o ex-ministro da Cultura Marcelo Caleri de agora, 2016, como bastiões da Civilização nesta sociedade que cada vez mais se barbariza, ainda que sabendo que como eles existem anônimos muitos milhões de outros verdadeiros cidadãos por este Brasil afora.

Entretanto, poderia e deveria também ter citado o Ministério Público Estadual como um destes baluartes na figura do promotor Carlos Eduardo Silva, sempre atento aos já corriqueiros deslizes na aplicação da legislação urbanística.   

A razão principal do Ministério Público é fazer as leis serem cumpridas, fortaleza da Civilização e das cidades, gêmeas que não sobrevivem sem as leis. Como poderiam conviver no espaço urbano milhares, milhões de cidadãos sem normas, estatutos, leis para ordenar essa convivência?

O próprio Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, o projeto da cidade, determinado pela Constituição Federal, é expresso em leis que precisam ser cumpridas, senão as cidades degringolam. Pois bem, passou-me despercebido, mas no dia 29 de novembro o noticiário local trouxe matéria informando sobre a anulação pela Justiça da Lei Complementar 367 de 4 de novembro de 2014 que criava o Distrito do Barreiro Branco em Cuiabá, em atendimento à ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual.    

Nada contra a criação de novos distritos, desde que tecnicamente viáveis e seguindo os ritos legais de tramitação. O problema é que a lei de criação do Distrito do Barreiro Branco vinculando sua área urbana “aos índices das Zonas de Expansão Urbana, possibilitaria que conjuntos habitacionais e outros empreendimentos imobiliários de considerável impacto ambiental e urbanístico fossem edificados no local”, conforme explicado pelo promotor Carlos Eduardo Silva. E qual o problema?

É que o Plano Diretor, revisto em 2007, proibiu por 10 anos a expansão da Zona Urbana de Cuiabá, reforçando sua orientação máxima de fazer a “cidade crescer para dentro” evitando seu maior espraiamento que gera custos operacionais elevadíssimos. Por isso as cidades hoje devem ser compactas, densas e diversificadas.   

Fora das zonas urbanas é proibido o parcelamento do solo para ocupações urbanas, conforme a Lei Federal 6766/79 e assim poderosos interesses fundiários sempre forçam a ampliação dos perímetros urbanos através de artifícios diversos, como “generosas” doações ao poder público de terras fora do perímetro. Mas em Cuiabá a criação do Distrito do Sucuri em 2011 inaugurou uma nova “metodologia” de ampliação ardilosa das Zonas Urbanas.

Criaram um novo distrito limítrofe à sede do município, definindo a Zona Urbana desse novo Distrito com cerca de 400 habitantes em dimensões suficientes para “encostar” nos limites da Zona Urbana do Distrito Sede de Cuiabá, em área bem maior que os 700ha da Morada da Serra, de 120 mil habitantes.           

Seria brilhante se esquecêssemos que o novo Distrito é parte de Cuiabá, e assim sua Zona Urbana também proibida de ampliações.

O sucesso da capciosa criação do Sucuri e o mesmo tipo de motivação estimularam então a criação do Distrito do Barreiro Branco, com uso da mesma “metodologia” e tendo como pretexto melhorias na qualidade de vida da população residente naquela área, benefícios que nada tem a ver com a criação de distritos e só dependem do interesse político, o mesmo demonstrado na artificiosa criação do Sucuri e do Barreiro Branco. Mas a Justiça tarda e não falha. E é a esperança das cidades.

 

*José Antônio Lemos dos Santos é arquiteto e urbanista, e conselheiro do CAU-MT.


Autor: José Antônio Lemos dos Santos


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