Enquanto os brasileiros sonham com o verão, o ministério e as secretarias estaduais de saúde preparam-se para o pesadelo da dengue. Especialistas esperam um forte surto do subtipo 2 da doença, que estava fora de circulação desde 2008 e, por isso, deve fazer muitas vítimas.
“A dengue é cíclica, sazonal, tem períodos de ascensão e de queda, como em 2017 e 2018”, explica Rodrigo Said, coordenador-geral de vigilância em arbovirose do Ministério da Saúde.
“No fim de 2018, houve alteração de sorotipo no Brasil, em especial no Centro-Oeste e Sudeste. Nos anos anteriores, havia os tipos 1 e 4. Quando há alteração no sorotipo predominante, aumenta o número de pessoas suscetíveis a contrair o vírus”, disse.
O avanço da dengue tipo 2 explicaria, por exemplo, o aumento no número de casos registrados neste ano em São Paulo — foram 666.915 até setembro, crescimento de 3.653% em comparação com o mesmo período do ano anterior — e em Minas Gerais (1.918%). Mato Grosso, após pelo menos dois anos de explosão de casos de chicungunha — vírus transmitido pelo mesmo mosquito da dengue, o Aedes aegypti —, lutará duas batalhas ao mesmo tempo, segundo o médico Alexandre Chieppe.
O plano de contingência para evitar que o serviço de saúde seja sobrecarregado prevê, além do combate ao mosquito, a criação de centros de hidratação, para tirar as pessoas com a doença da fila de atendimento comum. Até agora, o estado foi poupado do surto de dengue 2 visto em São Paulo e Minas Gerais por conta da chicungunha. “É muito difícil ver grandes epidemias simultâneas de vírus distintos”, diz Said.
De acordo com o especialista do Ministério da Saúde, os surtos relacionados ao sorotipo 2 em outras ocasiões tiveram muitos casos graves e ocorrência de óbitos. Os sintomas das dengues tipo 1 e 2 são semelhantes — febre acima de 38,5° C, dores de cabeça e ao movimentar os olhos, mal-estar, falta de apetite e manchas vermelhas no corpo.
“O Brasil vai continuar com a tríplice epidemia, com predominância de dengue e chicungunha (em relação à zika ). Pode ser que as regiões que sofreram com chicungunha passem a ter uma circulação mais intensa de dengue em 2020. Os planos de contingência no estado vão nesse sentido”.
“A gravidade da doença está relacionada a fatores individuais, sobretudo à quantidade de vírus inoculado e ao diagnóstico precoce. Quanto mais cedo entrar o tratamento sintomático, mais chances de cura”, afirma a bióloga Denise Valle, pesquisadora do Laboratório de Biologia Molecular de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz e especialista no Aedes aegypti.
Ela aponta que outro componente que pode influenciar são os contágios anteriores: se a pessoa tem a doença pela segunda ou terceira vez, ela tende a ser mais grave. Como esse vírus não circula desde 2008, as pessoas que nasceram desde então estão suscetíveis. “Torço para estar errada, mas, se acontecer, pode ser mais em crianças. Desde 2008, nasceram 2 milhões de pessoas que nunca entraram em contato com o vírus”, completa a pesquisadora.
Por enquanto, o ministério ainda não registra predomínio de casos em menores de 15 anos. A maior parte dos mais graves ocorreu em pacientes com mais de 60 anos, que têm doenças preexistentes agravadas pela dengue. “Mas mantemos o alerta. Com certeza há preocupação especial com crianças em todo o Brasil”, afirma Said. Diante desse quadro, o governo federal antecipou em um mês e meio o lançamento da campanha contra a dengue.
Autor: Constança Tats com Diario de Cuiabá