Não tenho religião. Nem sou uma fanática que acredita que todos os religiosos são pessoas alienadas. Embora não concorde com muita coisa, procuro respeitar profundamente a crença de cada um. A única coisa que não consigo entender é esta obsessão por difundir e fazer o restante das pessoas aceitarem e seguirem seus conceitos.
Não, eu não acho que uma igreja tenha que celebrar um casamento gay. Na verdade, acho que nem faz sentido um casal gay querer a bênção de uma autoridade religiosa que os despreza. Mas a questão não é o casamento em sua essência religiosa. É o direito civil de duas pessoas compartilharem suas vidas e bens.
A maioria das religiões prega que o sexo só deve ser praticado depois do casamento. Nem por isso vemos políticos declaradamente religiosos apresentando projetos de lei para que mães e pais solteiros sejam presos.
Sim, seria um absurdo, afinal cada um tem direito sobre seu corpo. É o tal do livre-arbítrio do qual, se não me engano, as próprias igrejas falam muito. Então, por que esta resistência política quanto à união civil entre dois homens ou duas mulheres?
Até consigo entender o dilema ético que um parlamentar que segue uma determinada religião enfrentaria, caso tivesse que aprovar uma proposta como esta. Mas também avalio que em todas as profissões – embora alguns insistam em dizer que a carreira política não é uma profissão – deve-se agir com profissionalismo.
Dada a lamentável falta de credibilidade dos nossos políticos, comemoro a decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Quanto às controvérsias sobre a atribuição do Judiciário de deliberar sobre o assunto, penso que a decisão deve ser contestada por quem se sentir lesado.
É aí que retorno ao ponto inicial: afinal de contas, por que os religiosos se sentem lesados com o casamento gay? Não é uma decisão que obriga determinada parcela da população a fazer algo com que não concorda. Pelo contrário, trata-se de estender um direito de muitos a todos.
O fato é que, em um estado laico, a religião, seja ela qual for, não pode interferir na política, a começar pelos crucifixos ou qualquer outro símbolo espalhados por repartições públicas; presidentes de tribunais invocando a proteção divina antes de julgamentos; feriados em comemoração a dias de santos.
LAURA NABUCO é jornalista e editora de política do Diário de Cuiabá
Autor: Laura Nabuco