Somente a posteridade, através do processo inexorável do determinismo histórico, pode oferecer um julgamento isento e correto da atuação do senador Filinto Muller.
Anos atrás, um jornalista no Comitê de Imprensa do Senado Federal salientava o papel exercido por Filinto junto aos Governos Militares pós-64, na preservação dos mandatos de vários parlamentares ameaçados de cassação pelo Olimpo.
Ficou, enfim, do pranteado líder político mato-grossense a figura do conciliador, do moderador, do apaziguador, do arguto articulador e notável dirigente partidário que foi. Nesta data de comemoração do 113º aniversário de nascimento do senador Filinto Müller e os 40 anos de seu trágico desaparecimento, trago a público alguns dados relevantes da extensa biografia do homem que me introduziu na vida pública.
Revolucionário de 22, de 24 e integrante do movimento vitorioso da Aliança liberal, em 1930, Filinto foi tenaz oponente da República Velha e inimigo declarado das “eleições a bico-de-pena”. Entusiasta do presidente Getúlio Vargas, foi um dos sustentáculos dos primeiros anos da República Nova e participe efetivo do trabalho de Vargas na consecução das reformas sociais e da criação da legislação trabalhista.
Coube a Filinto Müller, por amizade pessoal de Vargas, um ato de renúncia ao Governo de Mato Grosso em 1937, no mesmo dia, por solicitação de Vargas, renunciou ao cargo que mais esperava, retornando ao Rio de Janeiro com a missão penosa e ingrata de fazer as vezes de "homem duro" do regime que então se implantava pelas mãos de um "homem bom", misto de caudilho, estadista e líder carismático.
Filinto, apesar de uma acendrada formação humanística, vê-se, por contingência do destino, na chefia de Polícia do Estado Novo e, por conseguinte, apesar de não ter como coibir abusos e excessos da repressão getulista, passa a ser o alvo predileto dos ataques da esquerda festiva, de jornais clandestinos que publicavam torpezas jamais praticadas por Muller.
O Estado de Mato Grosso, sob a égide da influência de Filinto na capital da República, experimenta um dos seus períodos de maior desenvolvimento e progresso. Recursos sendo aplicados no Estado, benfeitorias sendo construídas em todos as áreas, escolas e hospitais se erigindo, os Poderes Públicos olhando para Mato Grosso e seu povo como nunca haviam olhado! Tendo como seu Governador Júlio Müller, irmão do líder, intelectual de larga reputação.
Com o término da 2ª Guerra Mundial, o regime de exceção passa a ser abertamente contestado e, e sob o Estado Novo, o ditador se recolhe a sua estância Itu, em São Borja. Filinto Müller, com prestígio jamais alcançado por homem público retorna a Mato Grosso, funda o PSD, e se elege senador Constituinte com invejável votação.
No Senado, com uma atuação brilhante e séria, Filinto se destaca como político de posições nacionalistas, defensor do monopólio estatal do petróleo, advogado dos grandes interesses nacionais.
Reeleito em 54, numa campanha emocional, sob o forte impacto da morte trágica do Presidente Vargas, Filinto participa ativamente da campanha vitoriosa de Juscelino Kubitschek. Este que o distinguiu com o honroso cargo de Líder de seu Governo no Senado.
E é nessa Líderança, na presidência do PSD, Filinto, torna-se defensor intransigente do Plano de Metas do Governo de Juscelino, e entusiasta da construção de Brasília.
Apoiou também a campanha do general General Lott e do vice-presidente João Goulart, na qual amargou a derrota com a vitória de Jânio Quadros, e também perdeu o Governo de Mato Grosso em 1950 para o Dr. Fernando Correa da Costa.
Após esta derrota, Filinto ergue-se em missão vitoriosa, torna-se líder da oposição no curto e pitoresco Governo de Jânio Quadros. Após saída de Jânio assume seu vice João Goulart e Filinto participa ativamente da formulação da proposta Parlamentarista do Governo, evitando um choque maior e o derramamento de sangue entre os brasileiros.
Mantendo postura discreta no Governo de Jango, logo após o movimento militar de 31 de março, Filinto volta às pressas do exterior com o objetivo de convencer a “quartelada” a não eternizar-se no poder.
Termina por se fazer líder do presidente Castello Branco e presidente Nacional da Arena. Todavia, não abdica, de sua característica essencial e marcante, seu espírito conciliador, e de sua aversão pública às cassações de mandatos e aos atos de exceção. Na condução da Arena, o senador Filinto Müller é o responsável pela ascensão de uma geração brilhante de homens públicos, gerados no “ventre” do partido situacionista, mas com origens no extinto PSD.
Filinto já antevia em conversas ao seu jovem afilhado, eu, Júlio Campos, a necessidade da volta ao Estado de Direito, da transição pacífica do poder aos civis, da regulamentação da atuação das empresas multinacionais no Brasil. Nos dias finais após a Constituinte de 46, via com olhos liberais o momento institucional brasileiro.
A morte, pela sua inexorabilidade e surpresa, ceifou de forma trágica e traumatizante a vida do senador mato-grossense. Em Orly, nos arredores de Paris, no dia de seu aniversário natalício, Filinto, ao lado da extraordinária figura da mulher e companheira Dona Consuelo e de seu neto Pedro, seu presumível herdeiro político, conheceu a morte e nos deixou a todos nós, amigos, seguidores, admiradores.
Neste 11 de julho completa 40 anos de seu falecimento, fica o registro isento no sentido histórico, mas engajado e passional no sentido humano, da imensa saudade, da falta grande que Filinto nos faz. Filinto, é julgado pela história, história da qual foi partícipe efetivo, corajoso, ousado e sensato. Esta é a homenagem que presto e julgo em nome de todo o povo mato-grossense, à memória do inesquecível Uder Filinto Müller.
*Júlio Campos é deputado federal por Mato Grosso.
Autor: Júlio Campos